quinta-feira, 13 de dezembro de 2007

Iconografias Kayapó

Posto agora, mas prometo comentar depois...




Mökam ne kuben ã pia'àm kêt?

Mas que falta de respeito com o velho! Custava ter pedido educadamente para ele despachar a bagagem? Afinal, com tantas armas circulando livremente pelo Brasil – incluindo-se granadas, sub-metralhadoras, fuzis anti-aéreos – qual o perigo real de uma caixa de cartuchos 22 que, todos sabemos, serão usados para caçar uns pobres queixadas ruidosos e uma ou outra anta distraída?


Diário de Cuiabá
Quinta, 13 de dezembro de 2007
Edição nº 11990 13/12/2007
(http://www.diariodecuiaba.com.br/)

Raoni é preso no aeroporto com munição

Liderança indígena caiapó portava, em sua bagagem, balas de armamento calibre 22, que foram detectadas pelo raio-x. Ele ainda desacatou policial federal

ADILSON ROSA
Da Reportagem

O cacique Raoni Metuktire foi preso ontem à tarde no Aeroporto Marechal Rondon, em Várzea Grande, acusado de posse ilegal de munição e desacato a um policial federal. Ele chegou num vôo de Brasília e pegaria outro para Sinop (a 500 quilômetros de Cuiabá) e, na hora do reembarque, o sistema de raio-x detectou algumas munições em sua bagagem. Funcionários do setor de segurança do aeroporto acionaram o policial federal de plantão.


Cacique foi levado para sede da PF como preso
comum, já que é civilizado e perdeu prerrogativas de indígena


Durante a verificação, o líder indígena ainda cometeu desacato contra o policial, o que resultou em mais um delito, além do porte irregular de munição. Ao analisar a bagagem de Raoni, o agente federal encontrou várias munições calibre 22, cujo transporte é proibido sem licença prévia. Testemunhas disseram que Raoni ironizou o trabalho do agente federal, que, do aeroporto, o levou de camburão para a Superintendência da Polícia Federal (PF), no centro de Cuiabá.

A reclamação do líder indígena em relação à ação do agente federal chegou a atrasar o embarque de outros passageiros. Até então, muita gente não sabia que se tratava do famoso líder indígena, amigo do cantor Sting.

“O policial foi desacatado pelo indígena e acabou sendo autuado pelos dois crimes que são afiançáveis em juízo”, explicou o delegado executivo da PF, José Maria Fonseca. “Se o advogado dele quiser liberá-lo, deverá procurar a Justiça Federal”. Até o fechamento desta edição, Raoni continuava nas dependências da PF e seria encaminhado para a Penitenciária Regional do Pascoal Ramos, para onde são levados os presos federais.

Fonseca lembrou que, por se tratar de um índio civilizado, Raoni perdeu as prerrogativas dos índios, considerados inimputáveis – que não respondem pelos atos, situação semelhante aos adolescentes – e responde pelos crimes comuns.

Índios da etnia caiapó de Colíder, onde Raoni mora, começaram a se mobilizar ontem quando para protestar contra a prisão do líder e estariam até pensando em vir para Cuiabá com tal fim.

NOTORIEDADE - Raoni Metuktire é um dos indígenas mais conhecidos em todo o mundo. Nascido em Mato Grosso, ele é considerado o chefe da etnia caiapó e participou diversas vezes de campanhas e ações internacionais em prol de seu povo, do Parque Nacional do Xingu e da floresta Amazônica. Antropólogos estimam que Raoni tenha cerca de 70 anos de idade, apesar de ele não ter registro civil.

O índio foi descoberto pelo sertanista Orlando Villas Boas em 1954 e, anos depois, em 1989, se tornou conhecido pela Europa ao acompanhar o cantor inglês Sting em uma turnê, na qual o tema do disco divulgado pelo artista era a luta contra a invasão de terras indígenas.

Espírito do dia

"I have read many books, but to little purpose, for want of good method. I have confusedly tumbled over divers authors in our libraries with small profit for want of art, order, memory, judgment. I never travelled but in map or card, in which my unconfined thoughts have freely expatiated."
(Robert Burton, The Anatomy of Melancholy, 1621)




Robert Burton escreveu um dos grandes livros de psicologia cognitiva avant la lettre: Anatomia da Melcancolia, de 1621. Mas o livro é muito mais do que isso, sem dúvida. É um tratado sobre o ser humano, a consciência e os estados da alma. Burton nasceu no século XVI, na Inglaterra. Passou boa parte da vida estudando em Oxford. Ali tornou-se vigário e grande erudito. Locke, por exemplo, inspirou-se bastante na terminologia e nos modelos cognitivos de Burton. É claro, Burton era um homem introspectivo, deprimido e melancólico. Deixou uma frase famosa, ao explicar seu maior empreendimento: "I write of melancholy, by being busy to avoid melancholy. There is no greater cause of melancholy than idleness, no better cure than business". Morreu em 1640.
Clicando no título do livro acima, vocês podem ter acesso gratuito ao texto integral em inglês, disponizbilizado pelo Projeto Gutenberg.


segunda-feira, 10 de dezembro de 2007

Economia Selvagem Premiado


Em outubro de 2007, o livro Economia Selvagem: ritual e mercadoria entre os índios Xikrin-Mebêngôkre, publicado na coleção NUTI, ISA pela EduNESP, ganhou o prêmio de Melhor Obra Científica em Ciências Sociais de 2006, no Concurso ANPOCS (Associação Nacional de Pós-Graduação em Ciências Sociais).

No ano passado...




No dia 23 de novembro de 2006 foi lançado meu livro “Economia Selvagem: ritual e mercadoria entre os índios Xikrin-Mebêngôkre” no Museu do Índio, no Rio.

Os índios Xikrin e a CVRD



Nas últimas semanas, os principais jornais do país noticiaram o imbróglio entre os índios Xikrin e a Companhia Vale do Rio Doce, em Carajás no Pará.
Os Xikrin são cerca de 900 índios, 80% dos quais com menos de 30 anos. Apenas uma pequena parcela fala fluentemente o português. Eles foram contatados nos anos 1950, sofreram perdas demográficas na década seguinte, e viram-se reduzidos a menos de cem pessoas. Recuperaram-se custosamente e agora enfrentam os enormes desafios – econômicos, políticos, culturais e existenciais – de viver na Amazônia em tempos de globalização.
No dia 01 de novembro de 2006, a CVRD anunciou a suspensão do apoio financeiro aos Xikrin em virtude da invasão de suas instalações pelos índios, dias antes. O auxílio está previsto desde 1989,quando a CVRD, atendendo à resolução 0331/86 do Senado Federal, firmou com os Xikrin e com a Funai o Convênio 453/89. Este prevê assistência à comunidade como forma de minorar os impactos ambientais causados pelas operações minerárias da empresa na área que é hoje a Floresta Nacional de Carajás, limite à terra indígena. Tal obrigação foi reiterada pelos decretos presidenciais 1298/94 (Art. 1º §2, item d) e 2486/98 (Art. 2º, parágrafo único).
Há uma brutal desproporção de forças entre a CVRD e os índios. Soa absurda a tentativa da companhia de incriminar a comunidade. Mais absurda ainda, e exagerada, é sua decisão de denunciar o caso à Organização dos Estados Americanos. A empresa sabe perfeitamente que os Xikrin não representam a ameaça alegada.
As discordâncias são antigas e giram em torno do dinheiro. Os índios consideram insuficientes os repasses e afirmam que só são ouvidos quando promovem atos de protesto. A CVRD vem ultimamente desqualificando as demandas indígenas e diz que não negocia sob pressão.
Em todo caso, é fundamental entender que as reivindicações dos índios por dinheiro e bens não são resultado de aculturação. Os Xikrin não são índios capitalistas, oportunistas ou degenerados. Sua busca por mercadorias obedece a uma lógica cultural própria. Ela está em continuidade com a forma tradicional pela qual os Xikrin relacionam-se com não indígenas e estrangeiros: incorporando de fora novos conhecimentos e capacidades técnicas e estéticas, e convertendo-os internamente em valor, por meio de uma sofisticada economia ritual e simbólica.
Quando essa dinâmica sociocultural depara-se com um universo de mercadorias e objetos produzidos em escala industrial, surgem efeitos complexos e inesperados para os próprios índios. O principal deles é o que poderíamos ver como uma espécie de “inflação” indígena: a rápida depreciação do valor dos objetos no interior da sociedade xikrin, criando novas demandas em espiral. Assim, apesar de perfeitamente legítimo, o consumo crescente que se vê entre eles tem resultados às vezes desvantajosos. Os Xikrin passam por um momento crucial e delicado.
Os responsáveis pelos assuntos indígenas da CVRD deveriam ter inteligência e sensibilidade para perceber que não estão em jogo apenas toneladas de minério ou alguns milhões de dólares, mas a vida de uma população humana, minoritária, que luta para sobreviver e manter seus valores e expectativas em um contexto histórico de mudanças rápidas e grande impacto.
A CVRD não é vítima dos Xikrin. Tampouco eles são vítimas da companhia. Mas é preciso um grande esforço para superar os mal-entendidos culturais e fazer com que a relação não seja de confronto, mas de cooperação. Para tanto, a companhia precisa sair de sua passividade cômoda, assumindo responsabilidades proporcionais ao seu tamanho.

(Escrito e publicado originalmente em Dezembro de 2006)

Ecos da questão Xikrin x CVRD


Aldeia Xikrin do Cateté


Algumas repercussões sobre o caso dos Xikrin com a CVRD.

Reportagem no site do Reporter Brasil, onde dou meus pitacos.
Aqui.

Reportagem para o Jornal Valor Econômico
Aqui.

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